segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Rachaduras no gelo da Antártida podem ser sinal do seu colapso


No ano passado, um pedaço de mais de 580 km² do glaciar de Pine Island, na Antártida Ocidental, se soltou e caiu no mar. Agora cientistas da Terra da Universidade do Estado de Ohio, nos EUA, detectaram a causa desse evento: uma rachadura que começou muito abaixo do solo e em terra.

É diferente de qualquer outra coisa que cientistas já tenham visto na Antártida Ocidental antes, e não parece ser um bom presságio para o futuro da camada de gelo.

Uma fortaleza congelada contendo água o suficiente para elevar o nível global do mar em muitos metros se derreter, a camada de gelo da Antártida Ocidental é separada do oceano por uma série de grandes glaciares. Por enquanto, esses glaciares agem como rolhas em garrafas de vinho para manter o gelo na baía, mas esse pode não ser o caso dentro de algum tempo.

Pesquisas recentes mostram que Pine Island, Thwaites e outras geleiras ao redor do mar de Amundsen estão retrocedendo rapidamente, à medida em que as águas quentes do oceano chegam às suas margens. Neste ponto, diz a NASA, o colapso de todo o setor do mar de Amundsen parece ser "imparável".

A maior questão é saber quão rapidamente esse gelo vai derreter, e, para descobrir isso, precisamos detectar os mecanismos responsáveis pelo colapso da camada de gelo. Para isso, um estudo publicado na Geophysical Research Letters volta ao verão de 2015, e chegou a partir daí em uma conclusão perturbadora.

"O evento em si não foi grande coisa," disse o pesquisador Ian Howat ao Gizmodo, notando que quebra de icebergs desse tamanho ocorre a cada 5 ou 6 anos em Pine Island. "O que fez isso ser diferente foi a forma como começou."

Em Pine Island e em qualquer outro lugar da beira-mar de Amundsen, a separação ocorre na parte externa da geleira, onde a camada de gelo é separada da rocha. "É meio que como um trampolim saindo de uma piscina", disse Howat. Normalmente, rachaduras começam a se formar nas áreas que experienciam cisalhamento extremo do gelo que flui do continente. Elas vão se propagar pela geleira, causando eventualmente a quebra total desse trampolim.

Não foi assim com o evento de Pine Island no ano passado. Ao analisar imagens de diversos anos tiradas pelo satélite Sentinel-1A, Howat e seus colegas ligaram a separação a uma fenda que se formou na base da geleira a cerca de 30 km de costa em 2013. Ao longo de dois anos, a fenda se propagou da parte de baixo até o topo, até que finalmente gerou um iceberg com dez vezes o tamanho de Manhattan.

O que poderia ter feito tanto gelo se quebrar de uma forma tão incomum? Aparentemente, o derretimento começou no ponto de contato entre o gelo e a base rochosa. Isso explicaria porque a fenda se sobrepôs como um vale topográfico - um lugar em que o gelo parecia ter diminuído - nas imagens de satélites tiradas no passado.

"Eu acho que estamos vendo a expressão de superfície de um vale muito maior na base da camada de gelo," explicou Howat. "Isso nos diz que a camada de gelo tem fraquezas que estão sendo exploradas pelo aumento nas temperaturas do oceano."

O problema é que, conforme as águas da Antártida Ocidental esquentarem, essas fraquezas vão ser mais e mais vezes exploradas. "Se a camada de gelo estava regredindo lentamente em escalas longas de tempo, nós esperaríamos ver apenas as separações normais," disse Howat. "Esse evento nos dá um novo mecanismo para camadas de gelo que se separam rapidamente. Ele se encaixa naquela imagem de uma regressão rápida."

Howat destacou que uma segunda fenda interior na camada de gelo (na imagem acima) foi detectada durante um estudo da NASA no começo do mês. E existem muitos outros vales topográficos - locais que podem sofrer com eventos parecidos no futuro -, mas nossa habilidade de estudá-los é prejudicada pela falta de bons dados.

É difícil ouvir isso e lembrar que o programa de ciências da Terra da NASA, que disponibiliza muitos dos dados para cientistas e para o publico - pode sofrer cortes grandes durante a administração Trump. Esses cortes viriam em um momento em que nosso planeta está mudando de forma rápida e difícil de prever, que é quando essa ciência é mais necessária.

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